Covid-19 ainda é causa de apreensão no Brasil
Quando Cilene Brito começou a sentir febre, em paralelo a uma tosse seca e constante, no começo de janeiro, ela supôs que havia contraído dengue. Em Itanhaém, cidade a pouco mais de 100 quilômetros de São Paulo onde ela mora, a doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti está em alta desde os últimos meses de 2023. À medida que os sintomas foram se agravando, porém, ela resolveu ir ao ambulatório do município vizinho, Peruíbe, próximo ao hotel em que ela dá expediente como recepcionista.
No dia seguinte veio o diagnóstico: covid-19. "Minha primeira reação foi surpresa com o resultado do teste, mas depois fiquei preocupada, porque provavelmente transmiti para mais gente enquanto estava trabalhando", lamenta. Um dos contaminados imediatos foi seu filho, Lucas, de 17 anos, com quem divide a casa. Ambos foram orientados a ficar em reclusão por uma semana, tratando da febre com medicamentos antitérmicos.
No começo de 2024, duas pessoas morreram de covid-19 em Itanhaém, segundo a catalogação de casos mantida pelo Ministério da Saúde. Em Peruíbe, foi um óbito até agora. Os números, aparentemente baixos, escondem um dos grandes dilemas do auge da pandemia no Brasil: a subnotificação. "Hoje em dia é muito difícil saber o número real de casos, porque muita gente descobre a doença por meio de testes vendidos em farmácias", explica Ralcyon Teixeira, diretor da Divisão Médica do Instituto Emílio Ribas, em São Paulo, um dos principais centros de infectologia da América Latina.
Tratamento de paciente de covid em hospital de São PauloFoto: Lincon Zarbietti/dpa/picture alliance
Mas não é só. Especialistas que permanecem debruçados sobre o SARS-CoV-2, o vírus da covid, concordam que, se os dados não são tão elevados quanto nos últimos anos, eles ainda preocupam por vários motivos. Embora a doença – que outrora pautava o noticiário, mobilizava as instâncias públicas, incentivava campanhas de prevenção, desenhava políticas públicas de saúde e repercutia no cotidiano do país – seja hoje um tema marginal em todos esses contextos.
"É uma doença altamente transmissível e que circula por mais tempo. Além disso, tem ciclos maiores do que a gripe, por exemplo – e só por isso já se espera que cause mais contaminações e mortes. Sem contar as variantes que seguem aparecendo, muitas delas ainda escapando da imunização existente", relata à DW o microbiologista Átila Iamarino, que ficou famoso durante a pandemia explicando o comportamento do vírus em seu canal do YouTube.
O peso das comorbidades sobre os óbitos
Só em janeiro de 2024, 769 brasileiros morreram por causa da doença, uma média de 192 óbitos por semana epidemiológica (ou 27 por dia). Comparando com os dados compilados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil foi o segundo país com mais mortes por covid-19 no mundo no período, atrás apenas das 6.800 nos Estados Unidos e seguido da Itália, que teve 550 registros. Além disso, foram mais de 127 mil casos confirmados pelo país – ou cerca de 35 mil por semana.
"As vítimas hoje estão se concentrando, principalmente, em imunossuprimidos e em idosos", revela o médico infectologista Julio Croda, pesquisador da Fiocruz, no Rio de Janeiro. "Daqui para a frente, é natural que a covid-19 permaneça como uma doença endêmica, se associando a mortes dependendo da cobertura vacinal da população e de possíveis novas variantes que forem surgindo."
De fato, várias pesquisas recentes têm mostrado como no Brasil a taxa de mortalidade está ligada, sobretudo, a casos de covid-19 em que as vítimas já possuíam doenças de base, como complicações cardiovasculares ou diabetes, por exemplo. "É difícil uma morte acontecer puramente por causa da síndrome gripal, como víamos há alguns anos. Os óbitos acontecem mais porque a covid intensifica um caso clínico anterior", corrobora Ralcyon Teixeira.
Fonte: Agência Brasil